Por Rodrigo de Oliveira
A ideia de contar a história de um logotipo não parece das mais interessantes – se formos levar em conta apenas o equivocado subtítulo brasileiro. Mas Air: A História por Trás do Logo é bem mais do que isso. No longa-metragem dirigido por Ben Affleck e com roteiro do estreante Alex Convery, conhecemos a curiosa trajetória de um sujeito que encasquetou que Michael Jordan, um então jogador de basquete promissor, mas iniciante na carreira, seria a figura ideal para ser a cara de um novo tênis que seria produzido pela empresa que ele trabalhava, uma tal de Nike. Mesmo que você conheça esses bastidores por conta de documentários sobre Jordan e cia, vale uma olhada neste longa de ficção que dá uma roupagem arrojada a uma trama cheia de obstinação, teimosia e alguma sorte.
Ben Affleck não é estranho a histórias baseadas em fatos. Seu principal trabalho atrás das câmeras foi Argo (2012), vencedor do Oscar de Melhor Filme, que contava a improvável, mas verdadeira história de agentes da CIA que fingiram ser uma equipe de filmagem para resgatar reféns do Irã. Em Air, a trama é menos rocambolesca, mas é extraordinária a sua própria maneira. Afinal de contas, estamos falando de um astro da estatura de Michael Jordan, simplesmente um dos maiores atletas que já pisou na Terra. A reverência ao mito faz sentido no longa, embora Affleck talvez tenha exagerado um tanto em algumas decisões.
Na trama, ambientada em 1984, conhecemos a Nike, uma empresa de calçados que não anda muito bem das pernas. Sonny Vaccaro (Matt Damon) era o responsável pela divisão esportiva da empresa, observando novos talentos que pudessem assinar contratos com a Nike para usar seus produtos. No basquete à época, a marca mais usada era a Converse, com a Adidas entrando forte no segmento. Com orçamento para assinar três ou quatro jogadores medianos da liga da NBA, Sonny bola um plano arrojado: e se a Nike gastasse todo o orçamento em apenas um grande nome? Ele havia visto o talento de um jovem Michael Jordan e apostava todas as fichas que ele seria um astro que poderia mudar o jogo para a marca. O chefão da Nike, Phil Knight (Ben Affleck), não gosta da ideia de colocar todos os ovos em uma mesma cesta, e é reticente ao negócio. Rob Strasser (Jason Bateman), o publicitário responsável, acha difícil que Sonny conquiste o atleta, ainda mais quando nem uma reunião com os Jordan a Nike conseguiria. Ouvindo um conselho de seu colega Howard White (Chris Tucker), Sonny decide ir ao encontro da família do jovem, passando por cima do agente David Falk (Chris Messina). Ele conhece o pai do rapaz, James (Julius Tennon), e a mãe, Deloris (Viola Davis) – esta quem realmente direciona a carreira do atleta. Michael não está interessado em conversar com a Nike, mas um bom argumento de Sonny faz com que a família ao menos aceite uma reunião. Seria possível virar a mesa em cima de concorrentes fortes como Converse e Adidas nesse cenário?
Não deve ser surpresa para ninguém que Jordan fecha com a Nike. Isso só é um spoiler se você nunca foi a uma loja de tênis ou nunca ouviu falar da marca Air Jordan. Mesmo tendo uma história com final tão previsível, Ben Affleck recheia seu filme com bons atores, uma trama com andamento rápido – Air é daqueles longas em que não se sente o tempo passar, de tão envolvente que é. O cineasta capricha na trilha sonora, fazendo uma mixtape de sucessos oitentistas, mas não esquece de colocar outras referências da época para ambientar a trama. O filme começa, aliás, com uma montagem de vários comerciais famosos do período – conversando totalmente com a temática da produção. A direção de arte, a maquiagem, os cabelos, tudo grita anos 80.
Nem tudo é acerto, é verdade. O fato de Affleck não querer escalar um ator para viver Michael Jordan distrai mais do que fortalece o filme. Nas cenas em que o rapaz precisa estar presente na sala, a câmera tem de se esforçar para não mostrar seu rosto ou enquadrar reuniões de maneira canhestra. É compreensível que o cineasta trate o personagem como uma deidade – em Hollywood, no passado, era comum filmes que envolviam a figura de Jesus Cristo não mostrarem seu rosto, por exemplo. Mas, aqui, o efeito atrapalha demais. Não seria problema algum ter um jovem parecido com Jordan na tela e as cenas dos jogos na televisão se manterem iguais, com o verdadeiro atleta jogando. Tarantino fez isso em Era uma Vez em Hollywood, com Margot Robbie vivendo Sharon Tate, enquanto os filmes sessentistas da atriz se mantiveram com a própria Tate. A plateia aceita isso. É um pequeno porém, mas algo bastante consciente de Affleck, que chegou a falar na imprensa que Jordan era grande demais e qualquer pessoa que ele colocasse ali seria falso. Mas isso é cinema, afinal de contas, e o trabalho do diretor é nos fazer crer na magia.
Ainda assim, Air: A História por Trás do Logo mais acerta do que erra. Consegue ser divertido, por vezes até engraçado – méritos para os Chris (Tucker e Messina) – e com boas performances do elenco como um todo. Viola Davis é sempre destaque em qualquer coisa que coloque o dedo e seu retrato como a inteligente e responsável mãe do jovem Michael é um dos principais predicados do filme. Damon e Affleck tem química fácil, dada a sua amizade atrás das câmeras. O vício em jogo de Sonny parece ser colocado mais para explicar sua maneira de agir do que vista como um problema real, dada sua aparição apenas no início da trama.
Produção da Amazon Studios, mas distribuída pela Warner internacionalmente, Air é uma mudança de estratégia da gigante do streaming. A maioria dos filmes com o selo da Amazon estreavam direto na plataforma, com passagens rápidas no cinema (quando aconteciam). A ideia agora é manter o longa na tela grande o tempo que for possível para só depois colocá-lo no catálogo do Prime Video. No Brasil, como é a Warner o distribuidor, não está claro se o longa chega primeiro no Prime ou na HBO Max.
FICHA TÉCNICA
AIR: A HISTÓRIA POR TRÁS DO LOGO
AIR
EUA – 112 min – Drama
Dirigido por Ben Affleck
Roteiro de Alex Convery
Com Matt Damon, Ben Affleck, Jason Bateman, Chris Tucker, Chris Messina, Marlon Wayans, Viola Davis, Matthew Maher, Julius Tennon
Cotação: 8