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Pânico VI

Foto: Divulgação/Paramount Pictures


por Rodrigo de Oliveira

Um dos maiores desafios de franquias longevas de horror é criar uma atmosfera de novidade. Afinal de contas, os fãs já viram várias histórias com os personagens, sabem as regras de trás para a frente, entendem o que seus heróis e vilões tem potencial de fazer. Não conseguir se renovar – ou ter ideias que fugiam muito do cânone da franquia (Sexta-Feira 13, estamos olhando para você) – costuma ser a causa mortis de várias séries cinematográficas. Pânico é um caso a parte. Por ser autorreferente desde o início, trazendo as muitas regras do gênero e as subvertendo, a cinessérie criada pelo cineasta Wes Craven e pelo roteirista Kevin Williamson conseguiu manter-se relevante a cada novo capítulo. Sim, a fórmula principal de um assassino mascarado matando pessoas a rodo sem que saibamos sua identidade se mantém a mesma, mas cada novo filme (com seus altos e baixos) conseguiu colocar uma peça diferente na história. As novas sequências, as primeiras sem Craven, concebidas pela dupla Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett, podem até dividir os fãs mais hardcore pela maneira como resolvem algumas questões de seus personagens-legado, mas são inegavelmente capítulos que jogam a série para frente, algo essencial para sua longevidade. Mais brutal que os anteriores, Pânico VI traz boas surpresas ao retrabalhar mais uma vez a fórmula dos slashers.

Foto: Divulgação/Paramount Pictures

Na trama, reencontramos o “core four” (ou “quarteto top”, como a tradução nacional chamou) do longa anterior. As irmãs Sara (Melissa Barrera) e Tara Carpenter (Jenna Ortega) e os irmãos Chad (Mason Gooding) e Mindy Meeks-Martins (Jasmin Savoy Brown) se mudaram para Nova York, na tentativa de deixar o trauma de Woodsboro para trás. Sara, no entanto, tem encontrado dificuldade em permitir com que sua irmã mais nova tenha experiências comuns de uma jovem universitária. Se não bastasse o medo de confiar em novas pessoas, Sara ainda precisa lidar com o fato de que muita gente acredita que foi ela a responsável pelos assassinatos do ano anterior, muito por conta de ser filha de quem é. Quando uma nova matança começa, ela se torna a primeira suspeita e, claro, a primeira potencial vítima. Junto de seus amigos antigos e novos, ela tenta se proteger, enquanto combate sentimentos complexos, como o medo de ter sede de sangue como o pai.

A primeira pergunta que deve estar na ponta da língua dos fãs é: Sidney faz falta? Lógico que sim. A personagem-legado é a estrela da série desde o início e Neve Campbell cresceu entregando a cada novo capítulo algo interessante. A boa notícia é que não ficamos pensando nela o tempo todo. O roteiro de Pânico VI, assinado por James Vanderbilt e Guy Busick, dá um jeito de explicar a ausência dela em um diálogo rápido e respeitoso. Para quem não sabe, a atriz não aceitou retornar à franquia por conta do valor irrisório que a Paramount teria oferecido. Quanto ao core four, o filme consegue desenvolver melhor as duas protagonistas, enquanto os Meeks-Martins continuam no banco de trás, sendo os responsáveis (Mindy, especialmente) pelos momentos mais expositivos. Os personagens coadjuvantes – Ethan Landry (Jack Champion), Quinn Bailey (Liana Liberato), Anika Kayoko (Devyn Nekoda) e Danny Brackett (Josh Segarra) – são os clássicos bucha de canhão em qualquer slasher do estilo whodunit, servindo ao mesmo tempo como vítimas ou potenciais vilões. Dermot Mulroney e Henry Czerny são os atores veteranos que vem para dar um pouco mais de peso ao longa e não decepcionam.

Foto: Divulgação/Paramount Pictures

Dito isso, a ideia aqui foi deixar tudo o mais amplo possível para não dar spoiler para ninguém – inclusive para quem ainda está atrasado e não assistiu ao Pânico de 2022. A partir daqui, entrarei em detalhes a respeito dos dois filmes, portando pare de ler caso não os tenha assistido. Sem David Arquette, que teve seu final definitivo no capítulo anterior, e Neve Campbell, coube a Courteney Cox carregar a tocha do elenco original. Sua participação é menor do que de costume, mas é forte o suficiente para fazer valer sua presença. Difícil não torcer por ela, mesmo que em quase toda a série ela tenha sido retratada como alguém desalmada. Hayden Panettiere é outra que retorna – foi uma das protagonistas de Pânico 4 (2011) – e deve fazer a festa de quem conheceu a cinessérie a partir daquela época. Os cineastas fazem questão de incluir uma deixa musical para a entrada da personagem, o que para os fãs mais antigos até pode soar exagerado. Mas faz sentido dentro da ideia da aura respeitosa que as sequências-legado tratam todos que vieram antes.

O conceito de trazer um verdadeiro santuário para os homicidas da cinessérie é algo que só Pânico poderia fazer, com sua verve autorreferente na enésima potência. Mas essa não é a melhor novidade. Quando a história começa, existe uma pequena mudança que poderia sugerir um novo caminho para a franquia. Na cena inicial, Laura Crane (Samara Weaving) está esperando em um bar pelo seu encontro à escuras. O rapaz parece ter se perdido e liga para a moça para conseguir se achar. O que segue é algo clássico, com a pessoa do outro lado da linha fazendo perguntas sobre filmes de horror (Laura é professora de cinema na Universidade), mas sem o modulador de voz. Não é surpresa para ninguém que a tal pessoa é, na verdade, um assassino. A mudança é que sabemos a identidade do sujeito logo após a morte de Laura – é Jason Carvey (Tony Revolori), seu aluno, que está matando pessoas e tentando “terminar o filme” que o assassino anterior, Richie (Jack Quaid), começou. Pânico teria abandonado o estilo whodunit e revelado logo de cara seu assassino? Até seria interessante, ver a história pela primeira vez através do olhar do vilão. Mas obviamente não é isso o que acontece, com Jason tendo um fim tão logo o verdadeiro ghostface surge para estripa-lo e retomar seu lugar de direito. A cinessérie é famosa por cenas iniciais de impacto e esta é, sem sombra de dúvidas, uma delas.

Foto: Divulgação/Paramount Pictures

Brutalidade é uma palavra que pode ser colocada ao lado de Pânico VI sem maiores problemas. Os diretores Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillet não economizam no sangue, nos closes em facadas e em mostrar o estresse no corpo daqueles jovens assassinados. Em uma franquia que foi comandada pelo pai do criativamente sádico Freddy Krueger, é salutar que a dupla tente seguir os passos do mestre e ir um tanto além. Talvez a ideia do ghostface utilizar uma arma de grosso calibre não seja das melhores, mas ao menos acontece de maneira crível – bem menos verossímil é o fato das duas vítimas conseguirem escapar com alguém as caçando com uma escopeta em uma loja de conveniência. Tara e Sara, aparentemente, estavam protegidas por serem as protagonistas.

Existe uma cena pós-créditos, mas jocosa, uma piadinha que faz sentido com a franquia. Por falar em créditos, é ótimo ver Roger L. Jackson aparecendo em destaque ao final – algo que começou a acontecer no longa anterior, de 2022. O ator é a voz de ghostface desde o primeiro longa e é uma das marcas registradas da franquia. Se existe um ator-legado que não pode faltar em Pânico, é ele. Aliás, com a saída de Campbell, Jackson e Courteney Cox se tornam os únicos a aparecerem em todos os filmes.

Foto: Divulgação/Paramount Pictures

Com um desfecho rocambolesco que revela a identidade dos assassinos como de costume, uma mistura de discurso de vilão de James Bond com o monólogo clássico dos whodunit (com a diferença que sempre é o assassino quem explana, não um detetive particular ou algo que o valha), Pânico VI é mais um capítulo divertido de uma franquia que não se cansa de voltar para mais. Pelo desfecho, tudo indica que teremos novos filmes, mais cedo do que tarde.   Resta agora que a Paramount acerte seus ponteiros com Neve Campbell para que Sidney Prescott possa retornar com toda a pompa (e cachê) que merece.

 

FICHA TÉCNICA
PÂNICO VI
(Scream VI)
EUA – 123 min – Horror
Direção: Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett
Roteiro: James Vanderbilt e Guy Busick
Com Melissa Barrera, Courteney Cox, Jenna Ortega, Jasmin Savoy Brown, Mason Gooding, Hayden Panettiere, Jack Champion, Devyn Nekoda, Josh Segarra, Liana Liberato, Tony Revolori, Samara Weaving, Dermot Mulroney, Henry Czerny, Andre Anthony, Thomas Cadrot, Roger L. Jackson
Cotação: 8

 

Mais sobre a cinessérie Pânico? Escrevemos sobre o quinto filme em nossa Almanaque21: Streaming #14. Leia gratuitamente clicando no link.