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Mais que Amigos

Fotos: Cortesia Universal

Por Rodrigo de Oliveira

Se você pensar em comédias românticas que transformaram o gênero ou trouxeram grandes novidades, invariavelmente vai chegar a uma lista com títulos como Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (1977), de Woody Allen – pela maneira como quebrou o tempo narrativo e criativamente contava sua história – Harry e Sally: Feitos um Para o Outro (1989), de Rob Reiner – pela ousadia das verdades que trazia sobre a relação homem-mulher – e, talvez, Mensagem para Você (1998), de Nora Ephron – não pela narrativa, mas pelo relacionamento online dos personagens, uma novidade para a época. Podemos colocar na conta ainda O Virgem de 40 Anos (2005), de Judd Apatow, que além de ser uma comédia romântica pouco convencional, solidificou o bromance em Hollywood. Mais que Amigos, de Nicholas Stoller, sabe de sua importância para o gênero, sendo a primeira comédia romântica LGBTQIA+ lançada por um grande estúdio, e não se furta em herdar a tocha das produções supracitadas, as citando nominalmente ou fazendo referências nada veladas. De maneira inteligente, Stoller e o roteirista Billy Eichner utilizam esse conhecimento pregresso do espectador para nos presentear com uma história romântica com certo frescor – não só pela sexualidade dos protagonistas, mas pelos diferentes dramas e neuras inerentes a um relacionamento gay.

Na trama, Bobby (Eichner) é um podcaster famoso, alguém que sempre levantou a bandeira pela causa LGBTQIA+. Ele lutou pela chance de ser o líder de um museu em Nova York que conta a história da diversidade sexual dos Estados Unidos – e as reuniões com seu conselho são ótimas, até por deixar claro que não é porque a comunidade é unida que não existam rusgas e outras mentalidades entre gays, lésbicas, bissexuais e trans. Bobby está em seus 40 anos e nunca teve um relacionamento sério. Para ele, deixar se levar pela paixão era um sinal de fraqueza. Sua liberdade e individualidade são importantes. Ele tem casos aqui e ali, geralmente por aplicativos de relacionamento. Isso muda quando ele conhece Aaron (Luke Macfarlane) em uma festa. O rapaz não está à procura de um namoro, mas os dois parecem ter uma boa química. O problema é que Aaron gosta de homens musculosos e de aventuras sexuais com diversos parceiros, algo que 1. Bobby não é; e 2. Bobby não curte. Apesar dessas diferenças, o casal consegue fazer o relacionamento funcionar. Até que problemas como ciúmes e neuras os atrapalhem.

Por ser um filme de grande estúdio, lógico que a Universal não iria fazer algo muito nichado. Mais que Amigos é desenhado para ser um longa representativo para a comunidade LGBTQIA+, mas também comunicável com a plateia heterossexual. Nessa questão, a referência a comédias românticas conhecidas tenha sido um caminho acertado. De Noivo Neurótico, Noiva Nervosa, Eichner tem seu protagonista falante e um tanto abrasivo. Se você reclama de o quanto Bobby fala e do quanto ele tem opiniões que, muitas vezes, o deixam afastado dos demais, lembre de Alvy Singer de Woody Allen – que era até mais neurótico e boquirroto. De Harry e Sally, o roteiro herda as “verdades” sobre relacionamentos – e, claro, algumas cenas como a árvore de Natal sendo levada por Aaron e o momento em que ele corre para encontrar Bobby. De Mensagem para Você, o próprio filme aparece, mas a trilha de Marc Shaiman busca se aproximar do que ouvíamos no longa de Ephron. E de O Virgem de 40 Anos, o próprio clima mais despojado e sexualmente explícito – sem contar que o próprio Judd Apatow é o produtor executivo aqui.

Por nos apresentar a um ambiente familiar, Mais que Amigos abraça o mais variado dos públicos, deixando o caminho aberto para contar sua história. Eichner faz um bom trabalho como o protagonista, um sujeito de grande confiança enquanto sua sexualidade ou de seu papel no mundo, mas com várias neuras a respeito de relacionamentos. Ele não se acha alguém desejável, ainda mais quando está com Aaron. Este, por sua vez, não tem qualquer tipo de problema com sua aparência física, mas tem enormes conflitos em como as pessoas o veem. Ele se preocupa em como seus pais e irmão encaram sua homossexualidade – embora não pareçam incomodados, Aaron tenta protegê-los. Seus gostos musicais e cinematográficos parecem um resquício de uma época em que ele precisava se mostrar hétero (o que chama a atenção de Bobby). Por essas e outras, Aaron acaba sendo o personagem mais interessante do filme – e Macfarlane tem uma bela atuação. Eichner diverte, mas por ter um papel mais verborrágico, demora um pouco para entrarmos em sua história – ou melhor, chegarmos à velocidade dele. Mas passados dez minutos, estamos já totalmente imersos na trama e, alguns minutos depois, torcendo para que Bobby e Aaron se acertem e fiquem juntos.

O elenco coadjuvante é ótimo – e aqui vale uma referência nominal aos atores e atrizes que fazem parte do conselho do museu: Miss Lawrence, TS Madison, Dot-Marie Jones, Eve Lindley e Jim Rash. Daria para fazer um spin-off só com a ação dentro do museu e seu conselho. As participações espertas de Debra Messing (vivendo uma versão de si mesma) e Harvey Fierstein são divertidas, isso sem falar em convidados especiais surpresa (que deixaremos no anonimato para não dar spoiler). Mais que Amigos se revela uma ótima comédia romântica, com tudo o que o gênero tem de melhor e com novidades pertinentes por ser realizada sob o prisma LGBTQIA+.

MAIS QUE AMIGOS
(BROS)
EUA – 115 min – Comédia Romântica
Dir.: Nicholas Stoller
Rot.: Billy Eichner, Nicholas Stoller
Com Billy Eichner, Luke Macfarlane, Guy Branum, Miss Lawrence, TS Madison, Dot-Marie Jones, Jim Rash, Eve Lindley, Monica Raymund, Guillermo Diaz, Jai Rodriguez, Amanda Bearse, Debra Messing, Peter Kim
Distribuição: Universal
Cotação: 8